NOTAS DA REPÚBLICA PORTUGUESA

NOTAS DA REPÚBLICA PORTUGUESA

domingo, 12 de setembro de 2010

A Revolução Republicana de 1910


Como se fez a revolução (Mantido o texto original)
Fonte: Eu Sei Tudo - Outubro de 1918 (oito anos após o facto histórico)

O Sr. José Relvas, fazendo a proclamação da Republica das janellas da Camara Municipal de Lisboa no dia 5 de outubro de 1910.


"Narremos resumidamente como se fez a revolução. O movimento começou pouco depois da 1 hora da manhã de ante-hontem, pela sublevação do regimento de infantaria 16. O povo entrou no quartel e sahiu acompanhando os soldados até Campolide, onde a artilharia 1 adheriu aos revoltosos. D´ahi dirigiram-se estes para a Rotunda. Entretanto revoltavam-se as guarnições dos navios de guerra.

A´s 10 horas mandaram os revoltosos da Rotunda uma vedêta á Praça dos Restauradores, propondo ás tropas fieis que se rendessem, pois em caso contrario a artilharia descarregava sobre ellas. A proposta não foi acceita; a vedêta voltou á Rotunda.

Logo que alli chegou, iniciaram os revoltosos um mortifero tiroteiro, que victimou dezenas de soldados fieis.

As carroças de pão e leite que passavam na Rotunda eram obrigadas a descarregar os referidos generos, afim de serem augmentadas as provisões de bocca dos revoltosos.

No acampamento d´estes distribuiram-se armas e munições aos populares que as requisitavam. Cada um que o fazia era equipado com uma carabina, um revólver e um punhal.

As baterias de Queluz, que de tarde vieram em soccorro das forças fieis, foram derrotadas. O combate prolongou-se pela noute adeante.

As tropas monarchicas renderam-se ás oito, e meia da manhã de hontem.

A´s 9 horas foi proclamada a Republica na Camara Municipal.

O EMBARQUE. No dia da proclamação da Republica um fragil batel levava da praia da Ericeira para bordo do "yacht Amelia" a familia real portugueza que encontrava um refugio n´aquellas pobres taboas d´um barco tripulado por descendentes dos marinheiros da descoberta e que por sua vez entravam na Historia.


O barco "Bomfim", que levou o rei D. Manuel da praia da Ericeira para o navio do exilio


OS MARINHEIROS DO BARCO "BOMFIM" NO QUAL O REI D. MANUEL FOI PARA BORDO DO YACHT " D.AMELIA"
Da esquerda para a direita: Arraes João Carriço, remadores José Ramalho, Antonio Maria Pachita, José Sardo, Jeronimo Carramona, Basilio Casado Junior e Antonio Marques.


Uma photographia de inestimavel valor
NA PRAIA DA ERICEIRA EM 5 DE OUTUBRO, DIA DA PROCLAMAÇÃO DA REPUBLICA

A chegada da familia real, a sua comitiva ae varias pessoas ue a acompanharam até o momento do embarque nas canoas dos pescadores. A´frente do grupo: a rainha D. Maria Pia pelo braço do sr. conde de Mesquitella; senhoras das familias Castro Pereira, e Nuno Pombal, srs. Serrão Franco, conde de Marim, rainha D. Amelia, conde de Sabugosa, D. Manuel II, D. Maria Francisca de Menezes, os srs. José de Mello (Sabugosa), Waddington, tenente Feijó Teixeira, marquez de Fayal, Vellez Caldeira, condessa de Figueiró, marqueza d´Unhão e duas criadas. O criado particular do rei deposto, sr. Kukembuck Villar, estava em Caxias quando começou o bombardeio no palacio das Necessidades e correu a apresentar-se a D. Manuel II, que o levou comsigo para o exilio.


O aspecto da cidade

Impossivel é descrever o aspecto de Lisboa desde o inicio da revolução. Tentemos, porém, reproduzir a impressão que nos causou o que vimos.

Na madrugada do dia 4, as ruas estavam quasi desertas, e os poucos que as atravessavam faziam n´o apressados, interrogando um e outro sobre o que se passava, emquanto lá longe, no rio, troava a artilharia, e lá em cima, em Campo d´Ourique e em Campolide soavam as descargas de fusilaria.

A´s 3 horas o fogo abrandou um pouco: - as tropas avançavam para a Rotunda.

A´s 5 horas e meia recomeçou o tiroteio. Na Avenida e em S. Pedro d´Alcantara travaram-se verdadeiras batalhas entre os revoltosos e a municipal.

A ´s 7 horas apresentava o Chiado um aspecto tragico. Não circulavam trens nem automoveis, e viam-se pouquissimas pessoas que buscavam noticias.

Começaram a saber se as primeira novidades. Os navios de guerra estavam revoltados e tinham hasteado, á excepção do D. Carlos, bandeiras republicanas.

Durante o dia o movimento não augmentou, e o aspecto da cidade tornava-se momento a momento mais tragico, emquanto a artilharia continuava troando, e a infantaria e o povo descarregavam sobre as tropas fieis que atacavam os revoltosos.

Perto das 5, quando se travou a batalha entre artilharia 1 e as baterias de Queluz, e os navios bombardearam o Palacio das Necessidades, todos se sentiam num campo de batalha, em que num momento podiam ser victimados.

Assim era realmente. A metralha atravessava toda a cidade.

Cahiu a noute. Houve um momento de socego. Perto das 10 da noute, o fogo recomeçou. As ruas estavam desertas. Só nos locaes do combate as tropas e os populares se batiam com denodo.

De manhã, ás oito horas, renderam-se as primeiras tropas. A´s 8 1/2 era arvorada a bandeira verde e vermelha no Castello e no Carmo.

Os navios de guerra deram uma salva de 21 tiros.

As ruas começaram a animar se. Percorriam-nas grupos de militares e paisanos armados dando vivas e palmas. Descemos até a BAixa. As granadas dos navios haviam deteriorado muitos predios. No pavimento havia algumas poças de sangue. No Rocio viam se em varios locaes destroços da batalha. As ambulancias da Cruz Vermelha cruzavam-se, acclamadas pela multidão.

Entrámos na Avenida. Ahi causara o con bate prejuizos maiores do que em parte alguma. Os candieiros da illuminação estavam partidos, postes de electricos e ramos de arvores jaziam por terra, as balas haviam feito brechas em muitos predios.

Pela rua central e pelas lateraes subiam grupos de populares empunhando bandeiras: - iam visitar o acampamento dos revoltosos.

Mas eis que da Rotunda dão por engano uma descarga. Os populares inermes e as mulheres fogem.

Grupos de militares e civis armados correm para a Rotunda - peito exposto ás balas. A fuzilaria cessa. Havia tres mortos e dezenas de feridos.

Durante todo o dia atravessaram a cidade grupos de revolucionarios paisanos armados e militares manifestando o seu regosijo. Gente desarmada quasi a não havia, vehiculos poucos transitavam e as lojas permaneciam fechadas.

Frente occidental da barricada armada por populares na Avenida da Liberdade


O sr. Antonio José d´Almeida, primitivo ministro do interior da Republica, chegando para tomar posse do Palacio Real das Necessidades



Uma das janellas do palacio das Necessidades estilhaçadas pelas balas dos navios revoltados

A´s duas horas foi distribuida uma proclamação do sr. dr. Eusebio Leão, governador civil de Lisboa, aconselhando ordem e respeito pelas pessoas e pela propriedade.

Pouco depois o ministro do interior dr. Antonio José d´Almeida atrvessou as ruas discursando e fazendo o povo jurar que se manteria tranquillo.

A´s 3 horas começaram as prisões.Era emocionante o espectaculo da passagem das escoltas de civis e militares através das ruas da cidade, em que todas as lojas estavam fechadas, onde ás janellas appareciam mulheres, tendo estampada ainda no rosto a angustia das noutes da Revolução.

A´noute começou rareando o movimento de revoltosos. Todos se haviam concentrado na Rotunda e suas immediações esperando um ataque annunciado de forças monarchicas commandadas pelo capitão de artilharia sr. Paiva Conceiro.

Alli passaram a noute, immersos em funda escuridão, pois apagaram as luzes dos candieiros da Rotunda e da Avenida, para tornarem mais difficil o podere-nós visar.

O inimigo não veio, e esta manhã muitos revoltosos voltaram para a baixa, prendendo então muitos policiais da judiciaria que eram conduzidos ao governo civil. Mais movimentada estava já então a cidade.

Ao meio dia foi estabelecido o policiamento feito por praças do exercito e estudantes militares. Deixaram então de circular os batalhões de paisanos marchando á vontade, e as ruas passaram a apresentar um aspecto menos ordeiro.


A fuga da familia real

Sobre esse doloroso incidente a illustração Portuguesa da semana seguinte publicou, com as photographias que reproduzimos, as seguintes linhas:

"A familia real estava na praia da Ericeira para embarcar na tarde de 5 de Outubro. Um piquete de cavallaria separava-a do povo que enchia o topo das ribas; os dignatarios, os ultimos fieis, acompanhavam os seus passos difficeis dobre a areia, senhoras de familias fidalgas seguiam n´uma desolação aquelle exodo da realeza e os pescadores, contractados de ha pouco, preparavam com vagares enervantes os barcos Navegador e Bomfim que a deviam levar a bordo do Amelia. Ninguem fallava; entrara nos cerebros a comprehensão do irremediavel. O rei, deposto n´essa manhã pela proclamação da republica, olhava tristemente o mar; a figura alta da rainha mãe destacava entre a sua derradeira côrte; D. Maria Pia guardava no seu rosto enrugado como um vislumbre da sua decisão de ha pouco no paço de Mafra ao dizer, como outr´ora D. Maria I, que não queria fugir. Pelas 3 horas começou o embarque; entraram núm barco o rei com os seus dignatarios n´outro as rainhas com o sequito, um remador da alfandega e o capitão do porto, sr. Bensabat.

Na praia o circulo limitado dos fieis dizia compungido os ultimos adeus. De bordo não se voltavam; os barcos vogavam na mancha loira do lindo sol que dourav a as aguas n´essa primeira tarde da republica. Por fim chegaram ao Amelia que não fundeara; o rei encostou se ao hombro d´um marinheiro, deu a mão a um arraes que saltara para a escada do portaló e d´ahi a pouco cahia nos braços de seu tio D. Afonso que o aguardava lá em cima. As rainhas tinham chegado tambem ao tombadilho, e quando o capitão do porto quiz entrar no barco real, D. Amelia exclamou: "Não. Não entras. Por tua causa e dos teus companheiros é que nós estamos aqui!"

O official desceu. Dentro em pouco o Amelia partia levando para o exilio o rei Manuel II pelas mesmas aguaes out´ora sulcadas pelos galeões de Manuel I, o Afortunado.


Homenagem á 1ª República Portuguesa
 

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